30 de dez. de 2016

UM HOMEM GELADO

Parte um:



Um de nós deve morrer para que o resto de nós tenha uma vida mais significativa. E quem deve morrer é a gata – gata, ao invés de devolver meu sorriso, tirou meu sono.

Um dos funcionários da equipe deve ser o mais tolo. E o mais tolo deve ser o homossexual. Homens, homens, homens. Fiquei receoso no meu novo trabalho com tantos homens. Mas eu gosto deles. Os homens protegem. Os homens são amigos.

Sabe quando uma conversa antiga no whatsapp vai descendo e descendo até você não ver mais? E eu, fico tentando puxar ela para cima o tempo todo. Sabe quando você tenta salvar alguém de morrer afogado em um rio? Você puxa uma vez, puxa e continua tentando, mas há uma hora em que há de se saber parar, senão você se afoga junto. A mensagem é muito simples e só agora eu estou começando a entender: ele foi embora e ele não vai voltar nunca mais.

Ando fascinado por “Ariel” grande livro da grande Sylvia Plath. Em 1963, Sylvia Plath isolou as crianças em um quarto, vedou as portas e as paredes com toalhas molhadas e deixou as janelas abertas. Deixou pão e leite para as crianças. Daí, ela tomou uma grande quantidade de narcóticos, enfiou a cabeça no forno com o gás ligado e morreu em poucos minutos. Mas Sylvia tinha Ted, do jeito que tinha, mas tinha. E tinha as crianças. Eu não tenho nada.


Parte dois:



A fase apática que estou passando não afetou o treino de atletismo. Tenho ido quatro vezes por semana para a academia nas férias. Quando começo a sentir desespero, que me levou a abandonar muitos treinos, tomo um clonazepan, respiro, e continuo, e termino o treino. Hoje não fiz a ultima série de saltos sobre o caixote, meu joelho esquerdo estava doendo. Uma vez, uma técnica preta de atletismo disse “Se está doendo, pare” nunca esqueci dessa frase, e essa frase pode ser usada para muita coisa na vida...

A apatia me fez parar de ver filmes. Desde que ele foi embora, não consigo ir ao cinema, pois sempre íamos ao cinema juntos quando ele estava comigo. A apatia me fez para de ouvir música, pois ouvíamos muita música juntos. Essa, está voltando bem devagar: tenho ouvido três músicas da Liz Phair: “Chopsticks”, “Perfect World” e “Girls Room”, só essas três. A apatia não afetou a literatura, pois sempre escrevi sozinho, e não afetou o treino, pois sempre treinei sozinho.

Não estou preparado para uma nova pessoa na minha vida. Acho que ele, ele sim, deve estar fazendo uma orgia atrás da outra, pois ele não me amava anyway, mas isso não é da minha conta. Eu, eu mesmo, não tenho conseguido dividir meu corpo com ninguém.

Daí baixei o horn net: hornet no meu celular (Um aplicativo para encontros gays). Até pensei em encontrar alguém, mas a verdade é que não estou “horny” baixei o aplicativo para ouvir muitas vezes que sou lindo, que sou gostoso. Porém, acho que conheci por lá um dos homens mais bonitos do hornet. Moreno claro, 1,93m, joga voleibol, parece um modelo de catálogo, e se parece bastante com o Henrique Farinelli, o garoto mais bonito da USP. Trocamos whatsapp. Ele me disse “boa noite” no whatsapp ontem, que saudade de receber um “boa noite" pelo whatsapp. Quando ele voltar da virada no Rio de Janeiro, planejamos um encontro para nos conhecermos. Não custa conhecê-lo, por mais que eu ache que eu não esteja preparado.

Semana que vem volta: segunda quarta e sexta, treino de salto triplo (Sendo que quarta também tem salto em distância), quinta-feira, treino de dardo. Junto com as quatro sessões de musculação, é claro. Na semana seguinte, voltamos para a base ás terças e quintas. Quero estar em forma para competir em março. Isso me manterá vivo.


Parte três


Pensei bem na orgia no réveillon. Nem cheguei a pensar no réveillon na casa dos meus pais. Não vou nem para um lugar nem para o outro. Vou passar na varanda tomando sorvete.
Da orgia, acho que preciso preservar mais meu corpo, o meu corpo, ter mais cuidado com quem eu o divido. E foi em uma orgia que eu conheci o garoto que partiu meu coração. 
Espero que a minha irmã esteja menos depressiva que eu, que ela possa ir á casa da minha mãe socializar. O meu problema quanto a ir até lá é muito simples. Sabe o que eu tenho para dizer? Nada. Vou para ficar ocupando a boca com comida e com álcool? Com pessoas que só sabem falar e não sabem ouvir? E o álcool, eu parei com o álcool.
Tenho trabalho a fazer. Terminei meu quinto (ou quarto, depende) livro. Um romance novo, que modéstia á parte, é a coisa mais sensacional que já fiz. Preciso começar a recriar em português as 88 páginas que escrevi em inglês. Isso me manterá vivo.

Feliz ano novo
XOXO 

4 de dez. de 2016

O OCTATLO

Não fixe na mente o óbito prematuro, garoto. Apenas tome um calmante. Logo ele faz efeito, repousa e logo tudo fica bem, viu como funciona? Ah, o clonazepam... Como ele tem me ajudado. E o que dizer da minha garota, da minha gata siamesa? Sempre tão presente, tão carinhosa. Durante o repouso você acorda de repente e percebe a cabeça dela gorda e fofa repousando na sua canela.



Há vida na semana que vem. A vida está sempre acabando e começando o tempo todo. Talvez seja o que o esporte sempre quis me ensinar e eu nunca quis ou consegui aprender: Temos de movimentar o corpo o tempo inteiro, para seguir em frente.

Além da vida, sim, há muita gente dizendo não o tempo todo, em grande maioria, mas sempre há alguém dizendo sim. E teve mais uma vez. Uma multinacional americana me disse sim, me ofereceu emprego. Vou ter um peru no natal, vou ter dinheiro para comprar um panetone no natal, e para comprar chocolates de trinta centímetros com frequência, como gosto. O natal é católico e eu sou ateu. O natal é feliz e eu desculpe: eu não vou conseguir sorrir nesse natal, nem no ano novo. Não quero mostrar meus olhos tristes para a minha mãe nem para o meu pai no réveillon, eu não quero que eles saibam que estou triste. Vou dizer que me chamaram para uma festa, como já fiz em réveillons passados, mas eu vou passar sozinho e quieto em um abrigo subterrâneo anti bomba.

Tanto tempo esperando e durou um período de tempo tão curto para eu finalmente perceber que não sirvo para as dores do amor romântico. E isso não é sobre aceitar ficar “sozinho” para sempre, pois eu nunca estarei sozinho. Meu pai e minha mãe estão vivos e com saúde, e eu sempre vou poder contar com eles. E o que dizer da minha garota? Da minha gata siamesa, sempre presente, sempre tão carinhosa e tão gorda. Quer saber? Ela vai sofrer fazendo dieta. E ela não vai. Não me importa se é importante para a saúde dela. Ela vai morrer gorda e feliz. Quero que ela seja feliz até o último momento.




O garoto louro não quis meu amor, ele prefere meu silêncio. É mais adequado, se eu pensar friamente. É melhor assim. Já há muita maldade humana e abandono no mundo lá fora, eu não preciso dividir a cama com tais coisas. Isso me faz lembrar do trecho em que minha personagem Cracolene (feia) é rejeitada e morta por Jon (O belo garoto louro) no meu livro "O tiro de um milhão de anos" (Ed. Pasavento, 2015):

Nenhuma breve historinha relembrada, nenhuma montagem com os
‘Melhores momentos’ do que se espera da vida, ou: Nenhuma imagem de   
Cracolene
na montanha-russa, nenhuma imagem de
Cracolene
recebendo um diploma dentro de um tubo. Um fôlego fundo para as outras garotas, mesmo para Corvo que sabia que algo estava para acontecer, para começar a acontecer e não era já apenas um sentimento ou uma desconfiança.
         Cracolene
         Dessa vez foi rejeitada pelo garoto perfeito, a melhor rejeição que já teve. Ela jamais seria esfaqueada novamente. Ela finalmente se livraria da mancha no rosto. Finalmente. Cessaria a preocupação sobre o prédio em que morava, ou se iria desabar; ela é que desabaria por bem! E seria rápido, de golpe certo. Para
         Cracolene
         A vida está apenas começando, apenas começou.
         Todos temem a morte. Geralmente. As pessoas, a maior parte, deve visualizar que as pessoas mais sábias e/ou mais cultas aceitam pior a morte do que outrem. Pessoas tolas e pobres só pensam na quota do sofrimento. Para uma do tipo tola e pobre como
         Cracolene
         Morrer é descansar. Jon teme a morte exatamente por nunca sofrer, por perder a ‘Lourice’, a riqueza, o fato de nunca ter sido diretamente afetado pelo terceiro mundo que o rodeia e suas pessoas asquerosas. A asquerosa vida de
         Cracolene
         Estava acabando e isso até merecia um show, e ao vivo. Então ela relaxou apenas. Ser aceita por Jon e ter de aceitar a si própria após (O que seria bem mais difícil) seria bastante estressante, era então melhor passar adiante, morrer naquele momento.
         Cracolene
         Não tinha, nunca teve esse objetivo, o do triunfo, refletido exatamente como mostrado nessa ocasião, nesse show, mas o reflexo sim estava com ela, e era o que importava.
         Bob um e Bob dois a ergueram como se ergue um caixão, mas com uma frescura, com uma inocência, com uma banalidade como se levassem uma garota de biquíni para arremessar em uma piscina e assim arremessaram
         Cracolene
         Do topo do prédio. Nesse exato momento, a plateia acotovelava-se por um lugar no parapeito para ver ao vivo o corpo explodindo lá embaixo. Claro que havia um telão no palco para. Mostrando uma competente cobertura que contava com dezessete câmeras de resolução absurdamente alta. No site do show, a audiência podia acessar o vídeo de todos os garotos e garotas que já foram assassinados desde a estreia, e também podiam acessar um gráfico que listava todas as mortes e ranqueava o volume de sangue espirrado no momento em que o corpo explodia no solo, um colosso de entretenimento!  
         Raios...
         Cracolene
         Foi colocada direto na posição dezessete no histórico das mais fantásticas explosões de corpos deste Reality show.
         Cracolene
         Não perdeu a chance de desapontar pela última vez.
         Cracolene.


Pensei brevemente em um novo amor. Um jovem cordeiro ou um sugar daddy, mas. Quando se tem 31 anos de idade, não há tempo para mais nada. Pode ser uma mentira, mas é uma sensação muito forte. É a crise da idade.


Antes da minha integração no meu novo emprego, eu me esforcei, me esforcei muito no tradicional octatlo de fim de ano no atletismo da USP. Porém, eu optei por abandonar a competição na quarta prova por não concordar como a organização estava conduzindo o evento. 

Há males que vem para bem, como diria Maurren Maggi. Se ela não tivesse sido pega no doping em 2003, jamais teria engravidado, jamais teria sua adorável filha.

Há males que vem para bem. Ser abandonado pelo namorado me faz ter uma raiva para treinar tão forte, mas tão forte, que nem consigo imaginar o quanto vou saltar em 2017. Em 2016, durante o meu namoro, perdi muitos treinos, muitas competições, era gostoso, tão gostoso ficar deitado com ele, fazendo carinho na cabeça dele, passando tardes com ele. Foi ontem. ontem nos encontramos. ele enrolou, enrolou, e não disse claramente o motivo. A verdade é que só enjoou, só me usou e jogou fora. Espero que ele não me ligue ás 5 da manhã em crise, pois eu não vou atender o telefone. Não vou ser amigo dele. Ele nunca foi meu amigo.

Vou voltar feio para pista segunda-feira, por que não? feio e com raiva, feio e disposto a fazer muita força. A Sofia da poli também não é feia pra caralho? E não foi uma excelente atleta? Então eu também posso.



XOXO